quinta-feira, julho 28, 2005

Ainda sobre o ecologista céptico (comentários)

"O que é diferente, o que se distingue do resto, chama a atenção. É falado, noticiado, discutido, o que chama ainda mais a atenção. Quanto mais atenção tem, mais atenção chama e vice-versa. Mesmo que seja diferente pelas piores razões. Esta parece ser uma espécie de "lei social" com bastante aplicabilidade e que está na base de fenómenos de popularidade como a "Quinta das Celebridades" ou o "Big Brother". Suspeito que seja também o caso de Lomborg, embora para ter a certeza absoluta tivesse de ler e compreender toneladas de bibliografia, o que pessoalmente dispenso. Prefiro confiar no pouco que li, na minha intuição e em quem me parece ter mais credibilidade.
Parece-me que sim, Lomborg é uma treta.
"

Nuno, Aba de Heisenberg

"Uma pequena correcção, o livro de Lomborg é de 2001 (Cambridge University Press). Há um livro muito interessante da Danish Ecological Association, chamado "Sceptical Questions and Sustainable Answers", que pode ser obtido gratuitamente em pdf: http://ecocouncil.dk/english/ (link do lado direito). Este e outros recursos interessantes, além de numerosas correcções e desmistificações, podem-se encontrar no interessante http://www.lomborg-errors.dk/"

V.P.

terça-feira, julho 26, 2005

Regresso ao passado: Cavaco & Soares

A confrontação entre a candidatura presidencial de Cavaco e a de Soares é tudo aquilo que Portugal não precisa neste momento. Previsivelmente, será um debate conjugado no passado. Está-se mesmo a ver que haverá um ajuste de contas sobre o período em que Soares era Presidente e Cavaco era Primeiro Ministro. O lavar de roupa suja já começou, basta ler os comentadores do costume para o constatar. O debate será também retrógrado no conteúdo, pois tanto Cavaco como Soares andam alheados de grandes temas internacionais que marcarão os próximos anos: a política europeia, o aquecimento global, a penúria no planeta de água potável e de energia e a inevitabilidade de grandes movimentos migratórios para evitar o colapso do tandem trabalho-reforma. Em relação aos temas nacionais que merecem a intervenção presidencial, dificilmente qualquer um dos candidatos produzirá um discurso centrado em políticas que aliam a modernidade ao desenvolvimento, como a ecologia, a tecnologia, a ciência, a formação contínua dos trabalhadores e dos empresários, etc.
Além do mais, julgo que Cavaco não tem perfil para Presidente, possui sim um perfil claramente de Primeiro Ministro de direita. Julgo também que Soares cometeu um erro grave relacionado com o seu último mandato. Na altura, Soares teve a excelente iniciativa de realizar uma presidência aberta que denunciava as assimetrias e a excessiva centralização do país, o problema é que passados alguns meses Soares foi um dos que se manifestou contra a Regionalização. Se for eleito Presidente, Soares poderá voltar a realizar uma presidência aberta sobre as assimetrias e a excessiva centralização. O tema continua actual...

domingo, julho 24, 2005

Abre los Ojos

"Abre los Ojos" é na minha opinião um dos melhores filmes de ficção científica e o meu filme preferido de Amenábar, o realizador de "Mar Adentro". O filme baseia-se numa reflexão futurista sobre a possibilidade de podermos exercer o controlo do decorrer das nossas vidas recorrendo à tecnologia. Estamos habituados no cinema de Hollywood a ver este tema ser tratado de uma forma linear e desinteressante (ex: a série "Back to the Future"). No entanto, Amenábar introduz uma forte dimensão emocional ao tema, fazendo uso da cruel angústia do irreversível como detonador para um enredo cheio de suspense, onde o evoluir da história progressivamente nos vai fazendo duvidar sobre o que é real e sobre o que é a fantasia de César, o personagem principal. "Abre los Ojos" é ficção científica 5 estrelas, tendo sido este filme realizado sem grandes meios e quase sem recorrer a efeitos especiais, o que só abona a favor do talento de Amenábar.
Produzido em Hollywood, "Vanilla Sky" com Tom Cruise, é, segundo consta, um remake simpático deste filme.

quinta-feira, julho 21, 2005

Dois anos de Klepsýdra

Agradecimentos
Nuno Vargas, Escrita Aleatória, Isabel, António Baeta Oliveira, Rui MCB, Paulo César, Nelson Lourenço, Homem das Neves (autêntico Timo Rautiainen a ditar notas), Alexandre Monteiro (é esse o espírito Alexandre), António da Vila Dianteira, Eva Lima (boa ideia essa do puzzle), Contra-Indicado, Joaquim (adoro a Raia), José Pimentel Teixeira, Bruno Martins, Sofia...
Um abraço especial para os meus leitores da diáspora (cerca de 20%), que andam lá fora a lutar pela vida: no Brasil, na Bélgica, nos EUA, Espanha, França, Suiça, Reino Unido, Luxemburgo, Alemanha, Finlândia, Polónia, Holanda, Moçambique, Israel, Formosa, Canadá, Rep. Checa, Dinamarca, Austrália, etc.

Programa de festas

22.00-23.59 - E o grande final (koniec) com:
Kapela ze wsi Warsawa (Warsaw Village Band)

20.00-21.30 Piquenique junto ao Mondego, de preferência com os pés de molho, a contemplar a mancha verde do outro lado, em Santa Clara, que ainda não dizimada pela especulação imobiliária.

Cinema
18.00-19.52 - Sessão Especial no Cinema Avenida: "Le Goût des Autres" de Agnès Jaoui

Debate
17.00-18.00 - "A Política Comum de Pescas". Participantes: Corto Maltese, Capitão Haddock, Atum Toneca e o Comissário Europeu para as pescas Joe Borg

Hora Homem Objecto
16.00-17.00 - Eleição do guarda-redes T-shirt suada
Vitor Baía (SMS para Klep 01); Petr Cech (Klep 02); Dida (Klep 03)

Choupal Radical
15.30-16.00 - Concurso de caça a uma boa história: TVI vs Jornal 24 Horas
15.00-15.30 - Bungee jumping: Deficit nacional vs Assinatura da internet de banda larga
14.30-15.00 - Corridas de Submarinos (3 participantes): Tiago Monteiro, Paulo Portas e o primo de Isaltino que é taxista na Suiça.
14.00-14.30 - Final do concurso de lançamentos dos 3 pontos:
Manoel de Oliveira vs Michael Jordan

Palestras digestivas
13.30-14.00 - "O Fim da Klepsýdra e o último blogue", Francis Fukuyama
13.00-13.30 - "A solução para a pobreza no mundo é cortar os subsídios à Klepsýdra", Paul Wolfowitz

Almoço
12.00-13.00 - No Zé Manel dos Ossos ao som da Fanfare Ciocarlia

Rally Paper
08.30-12.00 - A cada dupla de concorrentes foi fornecido um canivete suiço e um citröen dois cavalos. O objectivo é somar o máximo de pontos desmontando (através da técnica José Bové) algumas das obras mais marcantes do nosso país:
Estádio Nacional - 1000 pontos
Túnel do Marquês - 500 pontos
Campo de golfe da Quinta das Lágrimas - 250 pontos
Repuxo de Oeiras - 100 pontos
Campo de golfe de Marvão -100 pontos
Arco de boas-vindas da Figueira da Foz - 50 pontos
Vendas de fornos, tijolos, mármores e estátuas gesso de leões,
águias e dragões à beira da EN 1 - 50 pontos cada
Casas do Benfica, Porto ou Sporting - 50 pontos cada
Rotundas de Viseu - 10 pontos cada

Desayuno
06.30-08.30 - Algures numa cafeteria de um parque de campismo de Castela e Leão (não digo onde é nem que me dêem choques electricos nos testículos com dois electrodos), onde o cliente tem o raro privilégio de lhe ser servido o pequeno almoço ao som de bom e estimulante jazz. Até parece que estou a ver o Samsa a pedir um bocadillo de jamón "sin mantequilla".

Klepsýdra Club House
05.15-06.30 - Expander
03.30-05.15 - Carl Cox
03.15-03.30 - Carl Cox Warm Up - DJ Muxaxo
02.45-03.15 - Monika Kruse
02.15-02.45 - Claudio Coccoluto
01.45-02.15 - DJ Vibe
01.30-01.45 - Warm Up - Jack de Marseille

Sessão de palestras científicas
01.15-01.30 - "O Raio da Klepsýdra", Niels Bohr
01.00-01.15 - "KED - Klepsýdra Electrodynamics", Richard Feynman
00.45-01.00 - "A Klepsýdra não joga aos dados, mas é bem capaz de jogar Civilization 17 horas seguidas", Tio Alberto
00.30-00.45 - "Será a Klepsýdra radioactiva?... Tem dias que sim", Maria Sklodowska (Madame Curie)

Abertura solene
00.00-00.30 - Discurso "A importância da Klepsýdra na minha vida" pelo Mestre de Cerimónias das comemorações deste ano, Goran Bregovic.

O fiel leitor deve estar a pensar que Bregovic tem uma klepsýdra lá em casa que funciona a slivovica, ou ainda que Klepsýdra é o nome da enfermeira que salvou Bregovic de uma cirrose, ou ainda que Klepsýdra é o nome de uma casa de alterne sérvia ou de uma simpática ovelhinha que pastava lá para os lados dos Balcãs. Nah, nada disso!

quarta-feira, julho 20, 2005

'Tá quase...

Faltam duas horas para a Klepsýdra fazer dois anos.
Está quase a sair o programa de festas ;)

Quando for grande quero ser diabético

Na praia a Eva Lima constatou a veracidade do recente relatório sobre obesidade infantil em Portugal. Nas minhas infelizmente fugazes escapadas pelos areais da Costa de Prata tenho constatado exactamente o mesmo. Em cerca de um terço das famílias que observo existe uma rapariguinha ou um rapazito obesos, com muitas banhas seguras por pernitas frágeis. Já aqui disse que não tenho nada contra os adultos que livremente escolhem ser obesos, nem acho que haja ideais de beleza que excluam os obesos ou os anorécticos, mas as crianças devem estar ao abrigo das consequências irreversíveis da obesidade e da anorexia. É que eu não acredito que a resposta à questão "o que queres ser quando fores grande?" seja: "quero ser diabético".

terça-feira, julho 19, 2005

O obsceno parque automóvel americano

Na entrada anterior referi que os EUA são o maior emissor de gases de efeito de estufa do planeta, mas bastariam as emissões produzidas pelas pickup e pelos automóveis citadinos americanos para colocar os EUA entre os 20 maiores poluidores do mundo. O pior é que não existe justificação para que os fabricantes americanos continuem a produzir carros com motores enormes (a regra é 2000 ou 3000 cm3 no mínimo) com consumos de combustível obscenos (>12l/100km em cidade) quando motores bem menores chegariam perfeitamente para as necessidades do americano médio. Um motor de 1600 cm3 é mais do que suficiente para um espaçoso carro familiar e um 2000 cm3 chega perfeitamente para um generoso monovolume. Sabemos que o parque automóvel europeu é radicalmente diferente, é bem menos poluidor e actualmente segue a tendência dos veículos citadinos de reduzidas dimensões do tipo SMART. A moda "SMART" pegou desde às marcas económicas, como o Fiat Panda (1200cm3-5,6l/100km), até aos mais luxuosos, como os classe A da Mercedes (1500cm3-6,2l/100km).


Uma das ocasiões em que aluguei um carro nos EUA pedi à empresa de aluguer via telefone um carro pequeno, "o mais pequeno de todos", disse-lhes que era Europeu e estava habituado a carros pequenos (um carro pequeno para um americano é um Toyota Corolla com três volumes). Trouxeram-me este exemplar que vos mostro na foto que tirei na altura. Trata-se, nada mais nada menos, de um Chrysler Intrepid ES com um motor de "apenas" 3500 cm3 (V6) e com consumo de 13l/100km em percurso citadino. Recebi uma bomba desportiva pelo preço da classe mais económica... é tudo à bruta naquele país!

segunda-feira, julho 18, 2005

Ainda sobre o G8 e as alterações climáticas

Sete dos oito países participantes no G8 de Gleneagles fazem parte do grupo dos 10 maiores emissores de gases de efeito de estufa, a excepção é a França que aposta forte no seu programa de produção de energia nuclear, com todos os riscos e desvantagens que esta opção comporta. No total, estes oito países são responsáveis por mais de 47 % das emissões de gases de efeito de estufa de todo o planeta. Os EUA são o maior poluidor do mundo em valor absoluto – o maior emissor de gases poluentes per capita é a Austrália – emitindo mais 5500 milhões de toneladas de CO2 por ano, representando este valor cerca de 25% do total das emissões poluentes do planeta.
Ao contrário dos restantes países do G8, os EUA ainda não ratificaram o Protocolo de Quioto. Esta situação deve-se em grande parte à influência que têm sobre a Administração Bush a companhia petrolífera Exxon e o grupo de pressão anti-Quioto Global Climate Coalition liderado por um representante da indústria americana, Glenn Kelly. Por muita cosmética política que se faça às conclusões do G8, enquanto este problema não for resolvido com os EUA, o G8 do ponto vista ambiental será sempre um fracasso. Estamos a comprometer gravemente o futuro e a correr um sério risco de deixar uma herança de desastres ambientais de consequências apocalípticas que as armas utilizadas até hoje pelo homem ainda não foram capazes de simular.

quinta-feira, julho 14, 2005

Livros que passaram à categoria de treta

Numa altura em que as principais revistas científicas, como a Science ou a Nature, publicavam artigos dando conta da relação entre a actividade humana e o aquecimento global, Bjørn Lomborg - que nunca publicou em nenhuma dessas revistas - publicava "O Ambientalista Céptico", uma obra de divulgação crítica da tese do aquecimento global provocado pelo homem. O livro serviu de conforto para muita gente, apesar de o Comité Dinamarquês de Ética na Investigação ter considerado a obra de Lomborg desonesta do ponto de vista científico ou de o editor da Scientific American ter escrito o seguinte sobre o livro: "O pensamento crítico e os dados objectivos são as pedras basilares de toda a boa ciência. [...] O livro 'The Skeptical Environmentalist', por Bjørn Lomborg, um estatístico e cientista político da Universidade de Aarhus na Dinamarca, deveria constituir por isso uma análise crítica bem vinda. Mas infelizmente não o é.". Neste sítio da Scientific American podemos encontrar alguns detalhes sobre alguns dos muitos erros cometidos por Bjørn Lomborg. Também as revistas Science e Nature publicaram artigos que denunciaram os numerosos erros de Lomborg.
Outro livro da treta que nega a influência da actividade humana no aquecimento global é "A Obsessão Antiamericana" de Jean-François Revel. Este é mesmo um livro da treta, pois ao contrário de Lomborg, Revel nem sequer se deu ao trabalho de fazer contas. Consultou a literatura que lhe convinha, independentemente de ter solidez científica ou não, e destilou o seu conhecido ódio antieuropeísta. A Europa, o aquecimento global e o Protocolo de Quioto, todos levaram por tabela. Algumas passagens do livro de Revel possuem mesmo requintes da melhor metodologia astrológica, por exemplo Revel acha que o aquecimento global não existe, mas depois mais à frente refere que seria demasiado caro travá-lo, portanto pelos vistos já existe, se é quantificável...

Apenas a polarização causada pelo conflito do Iraque entre apoiantes de Bush, que rejeita o Protocolo de Quioto, e os contestatários da intervenção explica o sucesso destas fraudes científicas publicadas em 2002 e 2003. Este documento emitido pelas academias das ciências dos países do G8 juntamente com as suas congéneres do Brasil, da China e da Índia são o tiro final na treta de Revel e de Lomborg.

quarta-feira, julho 13, 2005

Conclusões do G8 sobre as alterações climáticas

Da declaração final conjunta do G8 o que há de realmente novo é:

"All of us agreed that climate change is happening now, that human activity is contributing to it, and that it could affect every part of the globe."

Quer isto dizer que finalmente acabou a criancice de insinuar que o aquecimento global era um problema inventado pela Europa para a economia europeia se aproximar da economia americana. É um progresso significativo...

Blair acrescentou:

"It is combined, in addition, with a specific plan of action in respect of all the main issues, and that plan of action and the dialogue together will then be reported on, first of all at a meeting that will be held here in Britain on 1 November, and then in successive G8 Presidencies"

Óptimo!
No entanto, como já se esperarava, a questão do Protocolo de Quito ficou na mesma como a lesma. O que é péssimo e bastante perigoso para o futuro do planeta, aliás a seguinte passagem é suficientemente clara:

"We were never going to be able at this G8 to resolve the disagreement over Kyoto, nor to renegotiate a set of targets for countries in place of the Kyoto Protocol (...) If it is impossible to bring America into the consensus on tackling the issue of climate change, we will never ensure that the huge emerging economies, particularly those of China and India, who are going to consume more energy than any other part of the world, we will never ensure that they are part of a dialogue, and if we cannot have America as part of the dialogue on climate change, and we can't have India and China as part of the dialogue, there is no possibility of us succeeding in resolving this issue."

segunda-feira, julho 11, 2005

O arrastão florestal

O verdadeiro arrastão que grassa em Portugal é o arrastão do fogo nas nossas florestas, é todos os anos a mesma coisa, mas como não são cabo-verdianos ou brasileiros a praticar esse arrastão não vale a pena fazer policiamento ou sequer a vigia de todas as zonas de maior risco do país (foto TSF). Ainda se fosse para mandar umas bastonadas, mas agora elaborar planos e estratégias de prevenção, isso está quieto, o Portuga não se sente suficientemente motivado.
Já agora pergunto para que serve o orçamento atribuído à defesa do país, é para nos defender de quê? A marinha e a força aérea ainda justificam os investimentos, mas para que serve tanto quartel militar para o exército? Estão à espera que venham por aí acima os Marroquinos? Se há algo que nos está a causar danos irreparáveis neste momento são os fogos florestais, esse é o nosso maior inimigo, não é o Bin Laden, nem os Castelhanos, nem o Napoleão. Estamos à espera de quê para ter uma força de prevenção e de combate a incêndios com uma estrutura e um orçamento equiparados às forças armadas?

O aquecimento global e a probabilidade de incêndio
Os dez anos mais quentes jamais registados ocorreram todos desde 1990. Quer isto dizer que a probabilidade de existirem incêndios em Portugal tem aumentado bastante nos últimos anos e vai continuar a aumentar se o aquecimento global continuar.

É longe, não são ocidentais...

Eu sei, é longe, não são ocidentais, nem cristãos, mas o que é certo é que todas as semanas no Iraque ocorrem atentados de graves consequências, por exemplo ontem morreram "só" 34 pessoas (semelhante ao balanço oficial calculado por baixo dos atentados de Londres) num conjunto de sete explosões no Iraque. Compreende-se que o atentado de Londres mereça um bocadinho mais de atenção na Europa, mas as grandes declarações de horror e de choro internacional já não se compreendem tanto perante a indiferença do que está a acontecer no Iraque. Será isto também porque no Iraque se asneirou e convém fingir que não está a acontecer nada? Esta notícia de 10 linhas do DN foi a maior que encontrei nas edições internet dos jornais sobre os atentados de ontem no Iraque, enquanto os atentados Londres continua a encher páginas e a ajudar a vender jornais...

domingo, julho 10, 2005

Va, Vis et Deviens

Agora é a minha vez de recomendar à atenção do Francisco do Aviz, e já agora do Nuno Guerreiro, o filme "Vas, vis et deviens" de Radi Mihaileanu que aborda o assunto da migração dramática dos judeus da Etiópia, os Falasha, para Israel durante os anos 80. Só durante a primeira fase de migração dos 12000 Falashas que tentaram chegar a Isreal, cerca de 4000 morreram.
Curiosamente a personagem principal é um rapaz cristão que, para fugir à fome e às doenças dos campos de refugiados do Sudão, se faz passar por judeu sob a identidade de Schlomo de modo a poder ser transferido para Israel. O filme aborda a complexa questão de se ser estrangeiro, mas neste caso de um estrangeiro ao quadrado, um estrangeiro entre estrangeiros e um estrangeiro em todos os seus estados: nacionalidade, cor de pele, religião, língua, etc. A própria família de acolhimento é estrangeira, são "judeus-ateus" franceses de esquerda. Tudo isto se passa em Israel que em si é já considerado um país estrangeiro naquela região e cujos governantes (alguns) tratam os seus vizinhos como se fossem também estrangeiros. Enfim, a salada que nos serve este filme é muito boa e recomenda-se. Não sei quando o filme será estreado em Portugal, se é que será estreado, porque em Portugal todos os filmes que não sejam falados em "americano" é uma complicação.

sábado, julho 09, 2005

Memória curta IV: Bernad-Henry Lévy tinha razão

"Si ce livre commence au début de l'année 2002, le fait est qu'il se termine en avril 2003, en pleine guerre anglo-américaine en Irak. Et je comprends mieux, en l'achevant, pourquoi cette guerre, depuis ses prémices, m'inspirait un si vif sentiment de malaise. (...) Je rentrais de cet autre monde [Pakistan]. Tout le temps qu'a duré le débat sur la question de savoir si renverser Saddam était la priorité du moment et si le sort de la planète se jouait, ou non, à Bagdad, j'étais dans le trou noir de Karachi. Et je ne pouvais pas, je ne peux toujours pas, ne pas songer que cette guerre irakienne, par-delà même son coût politique et humain, par delà ses morts civils et le nouveau tour qu'elle ne manquera pas de donner à la roue mauvaise de la guerre de civilisations, témoignait d'une singulière erreur de calcul historique."

Bernard-Henri Lévy, "Qui a tué Daniel Pearl", Editions Grasset, 2003, pag. 13.

sexta-feira, julho 08, 2005

Memória curta III: Richard Clarke tinha razão

"I have a disturbing image of him [George W. Bush] sitting by a warm White House fireplace drawing a dozen red Xs on the faces of the former Al Qaeda coporate board, and soon perhaps on Usama Bin Laden, while new clones of Al Qaeda are working the back alleys and dark warrens of Bagdad, Cairo, Jakarta, Karachi, Detroit and Newark, using the scenes from Iraq to stoke the hatred of America even further, recruiting thousands whose names we will never know, whose faces will never be on President Bush's little charts, not until it is again too late."

"Against All Enemies", Richard Clarke, Free Press, 2004, pag. 287.

quinta-feira, julho 07, 2005

Memória curta II: Richard Clarke tinha razão

"Instead of addressing that threat with all necessary attention it required, we went off on a tangent, off after Iraq, off on a path that weakened us and strengthened the next generation of Al-Qaedas. For even as we have been attriting the core Al-Qaeda organization, it has metastasized. It was like a Hydra, growing new heads. There have been far more major terrorist attacks by Al-Qaeda and its regional clones in the thirty months since September 11 than there were in the thirty months prior to that momentous event. I wonder if Bin Laden and his deputies actually planned for September 11 to be like smashing a pod of seeds that spread around the world, allowing them to step back out of the picture and have the regional organizations they created take their generation-long struggle to the next level"

"Against All Enemies", Richard Clarke, Free Press, 2004, pag. 286.

Mais sobre o assunto nos Bicharocos como gráficos e tudo.

Estas entradas intituladas "memória curta" são entradas antigas da Klepsýdra, nada disto é novo...

Memória curta: De Villepin tinha razão

O discurso de Dominique de Villepin, Ministro dos Negócios Estrangeiros francês, perante a ONU a 19 de Março de 2003, altura em que os EUA estavam na iminência de intervir no Iraque:

"Make no mistake about it: the choice is indeed between two visions of the world. To those who choose to use force and think they can resolve the world's complexity through swift and preventive action, we offer in contrast determined action over time. For today, to ensure our security, all the dimensions of the problem must be taken into account: both manifold crises and their many facets, including cultural and religious. Nothing lasting in international relations can be built therefore without dialogue and respect for the other, without exigency and abiding by principles, especially for the democracies that must set the example. To ignore this is to run the risk of misunderstanding, radicalization and spiraling violence. This is even more true in the Middle East, an area of fractures and ancient conflicts where stability must be a major objective for us."

Ver ponto 2 do discurso de De Villepin

quarta-feira, julho 06, 2005

Sacrificar o planeta para salvar os EUA

"There is now scientific consensus that this warming [global warming] has been brought about by the increase in greenhouse gases in the atmosphere, which in turn has been caused by human activities – primarily the burning of fossil fuels and changes in land use."

Isto está no sítio do G8. Estão a ler o mesmo que eu não estão? Agora leiam isto:

"President Bush said in a Danish TV interview aired Thursday that adhering to the Kyoto treaty on climate change would have "wrecked" the U.S. economy", USA Today, 30 de Junho de 2005.

Ok, vamos então estoirar com o planeta para não tramar a economia dos EUA...

terça-feira, julho 05, 2005

Fissão por conFUSÃO nuclear ou gato por lebre (act.)

Descobri esta vergonha de artigo através do David Luz da Linha dos Nodos. O David Luz desmonta bem o chorrilho de asneiras com que nos brinda o autor. Sugiro mesmo ao DN que não pague este artigo ao autor Luís Miguel Viana (LMV), porque é um artigo tão mau que lança a confusão na opinião pública sobre estas questões que são importantíssimas fazendo recurso de uma argumentação profundamente errada e mal informada. Um jornal não é bem um blogue, a remuneração dos cronistas exige um mínimo de trabalho de pesquisa e se não se está suficientemente informado sobre um assunto o melhor é não escrever.

LMV escreve um artigo desta índole sem perceber que não existe praticamente relação entre um projecto de investigação (e não de comercialização ou de distribuição) para produzir energia nuclear por fusão como o ITER, e as centrais nucleares que produzem energia nuclear por fissão nuclear. O único ponto comum é que a fissão (processo de produção de energia das centrais nucleares) e a fusão (processo de produção de energia estudado no ITER) são explicadas pela mesma disciplina da física: a física nuclear. Também duvido que LMV tenha uma ideia da diferença entre fissão e fusão. LMV deve julgar que lá porque é tudo nuclear deve ser a mesma coisa!

O projecto ITER é um projecto de investigação internacional para estudar métodos e soluções para futuramente ser possível a produção de energia por fusão. Seria excelente um dia conseguir produzir energia através deste método pois teoricamente (sublinho teoricamente) seria um método limpo de produzir energia em quantidades quase inesgotáveis, como seria excelente também se Portugal se associasse a este projecto. Pelo contrário seria péssimo se Portugal desenvolvesse um projecto de construção de centrais nucleares, duvidoso e complicado do ponto de vista económico e perigoso e complicado do ponto de vista ambiental, quando em toda a Europa já não se constrói uma nova central nuclear há cerca de 20 anos. Actualmente, a Alemanha está a pôr termo ao seu programa nuclear e outros países, como a Itália, estão a reduzir bastante o seu programa de produção de energia nuclear por fissão. Como já aqui escrevi, o próprio orçamento da EURATOM para o 6° Programa Quadro da EURATOM 2002 a 2006 não deixa dúvidas ao atribuir cerca de 80% do orçamento ao ITER, dedicando apenas os 20% restantes à manutenção de centrais nucleares. Só uma leitura às avessas ou mal informada desta realidade, como a de LMV, é que pode ver no projecto ITER uma justificação para a construção de uma central nuclear em Portugal.

segunda-feira, julho 04, 2005

Curiosidades sobre a missão Deep Impact

- O projéctil lançado contra a superfície do cometa Tempel 1 consistia essencialmente de 370 kg de cobre.

- O cometa Tempel 1 demora cerca de 5 anos a completar a sua órbita à volta do Sol.

- O cometa Tempel 1 foi descoberto em 1867 no Observatório de Marselha pelo alemão Ernst Tempel.

- A missão Deep Impact foi a quarta de uma série cinco missões escalonadas até ao ano 2014 dedicadas ao estudo de cometas: em 1986 a sonda Giotto observou o cometa Halley, em 2001 a Deep Space One observou o Borelly, em 2004 a Stardust foi ao encontro do Wild 2, hoje a Deep Impact foi ao encontro do Tempel 1 e em 2014 a Rosetta largará uma sonda na superfície do cometa Churyumov-Gerasimenko.

Quase em directo

Ver aqui

domingo, julho 03, 2005

Deep Impact


Em directo na Klepsýdra e na Euronews a partir das 6.30 da matina.

Desde o momento em que a sonda foi lançada em direcção à superfície do cometa Tempel 1, para além da nave-mãe da missão Deep-Impact, outros "olhos" observam o impacto e os fragmentos ejectados pela colisão: a missão Rosetta (que enviará uma sonda até à superfície do cometa Churyumov-Gerasimenko em 2014), o telescópio espacial XMM de raios X e o telescópio Hubble.

sábado, julho 02, 2005

Ganhar menos que uma secretária...

O Francisco do Aviz chamou-me a atenção para o seguinte pormenor de Brida: "o namorado de Brida (que é secretária numa empresa de Dublin) ganha menos do que ela; ele é professor no departamento de Física numa universidade pública irlandesa"

Aproveito já para esclarecer que não sou professor universitário. Em física, os doutorados da minha geração depararam-se com os departamentos saturados de docentes e só entra um novo docente por cada quatro que se reformem ou...morram! Faço parte do grande pelotão de investigadores bolseiros (no meu caso do Ministério da Ciência) que ganha um bocadinho menos que um professor universitário e ainda menos que a secretária Brida. No entanto, não me preocupa nada o facto de uma secretária de uma empresa ganhar mais do que eu, nem o Zé Cabra, nem a Manuela Moura Guedes, nem o Ricardo do Sporting. Mas há outras coisas que me preocupam profundamente:

- Aqueles professores universitários que não investigam, não publicam, não são referidos pelos seus pares, não participam nem em projectos nem em redes nacionais ou internacionais, que passam a sua carreira a apresentar a mesma resma de acetatos. Em Portugal não devem ser nada poucos, arrisco a dizer que são metade e já excluo os que têm excesso de tempo de aulas. Alguns destes professores do acetato chegam ao ponto de escrever artigos em jornais referindo que "dantes é que o ensino era bom". Então não era! Era o tempo em que Portugal tinha o pior sistema de ensino da Europa (pior que países como Chipre ou a Albânia), em que não havia produção científica nas universidades, não havia interacção nem com as empresas nem com a sociedade. Estes professores se ganhassem menos que as secretárias seria da mais profunda justiça.

- Os investigadores bolseiros são responsáveis por cerca de 40% da produção científica nacional e são avaliados como não se faz em mais nenhuma actividade deste país. Ao contrário dos professores universitários não recebem 13° mês, não têm direito a subsídio de férias ou de desemprego e descontam através de um manhoso seguro social voluntário como se recebessem o ordenado mínimo. Os bolseiros não contam para o IRS o que os exclui de muitos procedimentos administrativos e financeiros indispensáveis para se viver com algum conforto, como pedir um simples empréstimo ao banco.

- Não existir uma aposta na ciência e na tecnologia (um plano apenas tecnológico, é como querer andar de mota só com a roda da frente) num país dos que investe apenas 0,8% do seu PIB em investigação quando a meta estabelecida pelos objectivos de Barcelona apontam para 3% em 2010. Ainda mais quando há exemplos na Europa de países que saíram de crises profundas apostando na ciência (Finlândia e Suécia).

- As empresas privadas nacionais praticamente não fazerem investigação (apenas 0,2% do PIB) e apostarem sempre na mão-de-obra barata, na exploração e na precariedade. Por isso não deverão existir muitas Bridas em Portugal.

- Toda a cambada de incompetentes que ocupam lugares em empresas públicas sem terem qualificações para os ocupar, nomeados pelo aparelho partidário do partido no governo. Isso choca-me bem mais que uma secretária ganhar mais que um professor, tal como me choca numa altura de crise o estado pagar a uma astróloga para participar em programas da RTP um salário equivalente ao que ganham 10 investigadores doutorados ou 20 investigadores licenciados.

sexta-feira, julho 01, 2005

UK entre o 51 Estado e a Mesa Europeia

Para não deprimirmos com os 6 longos meses de presidência britânica, aqui vão algumas reflexões interessantes de Jeremy Rifkin no prefácio da edição inglesa de "The European Dream" sobre a relação entre Reino Unido, a Europa e os EUA:

"In the 21st century, no country will be able to go-it-alone in an increasing global economy. Either the U.K. becomes the 51st American state - de facto - or it takes its place at the European table. (...) How does the U.K. expect to maintain its own currency ten years from now when most of the rest of the world is doing business in Euros ans dollars? (...) I can see why the U.K. needs either the U.S. or Europe, but not why either of the other two ultimately need the U.K. So where does this leave the U.K.?
If Great Britain chooses to attach its destiny to that of America, it will ultimately have to accept an American agenda and an American frame of mind as its own. If, however, the U.K. chooses to become an integral part of continental Europe, it will have to accept the duties and obligations that go along with surrendering some measure of sovereignity to become part of transnational political space. But, instead of seeing full membership in the European Union in purely negative terms, as something being forced on them by the flow of global events, the U.K. ought to consider Europeanization as a historic opportunity, with vast potential benefits for the British people.
"

"The European Dream", Jeremy Rifkin, Polity, Prefácio pp. xii-xiii