terça-feira, março 11, 2014

Estranhos métodos na avaliação das unidades de investigação

No comunicado emitido este mês pelo Conselho dos Laboratórios Associados levantam-se dúvidas pertinentes sobre o processo de avaliação das unidades de investigação: 

 - "No esquema agora anunciado, a FCT entrega a uma organização sem experiência na matéria, em graves dificuldades e em vias de extinção (a Fundação Europeia para a Ciência, em Estrasburgo - (ESF)) a responsabilidade de seleccionar e alocar peritos internacionais para a avaliação das unidades de investigação em Portugal"; 

 - "Carece de explicação cabal o contrato estabelecido entre a FCT e a ESF. Com efeito, com a criação da organização Science Europe em Outubro de 2011, a ESF encontra–se desde então em processo de extinção. Este facto torna ainda mais necessário justificar que a FCT tenha decidido transferir a responsabilidade da sua missão mais importante (a avaliação científica) para essa organização, em moldes mantidos inexplicavelmente desconhecidos pela comunidade científica"; 

 - "a FCT entregou também a responsabilidade de conduzir uma análise prévia bibliométrica (uma das novidades do novo esquema agora anunciado) à editora privada ELSEVIER. Tendo em conta que existe um organismo oficial responsável pela produção e elaboração de estatísticas e estudos para a ciência e tecnologia, a DGEEC – Direcção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência, que inclui a produção de indicadores na área da produção cientifica, qual a justificação de se encomendar esse estudo a essa editora e não a esse organismo?". 

Parece que já vimos este filme em qualquer lado. Uns contratos que se atribuem aqui e ali, sem transparência de critérios. A velha e má forma de implementar políticas continua instalada. É preciso acabar com isto e este comunicado é um bom instrumento para combater a falta de transparência.

segunda-feira, fevereiro 10, 2014

Quando um cábula das jotinhas discorre sobre ciência

Quando li as declarações de Passos Coelho sobre a evolução da ciência em Portugal tive alguma dificuldade em perceber se a trapalhada transcrita resultava de mau jornalismo ou da própria fonte das declarações. Depois de aceder à mesma notícia dada por outros jornais percebi que o cábula das jotinhas tinha despejado mesmo aquela trapalhada. Estava para escrever umas linhas sobre o assunto, mas o Prof. Carlos Fiolhais já disse quase tudo o que me aprazia dizer. Ler a entrevista integral do Prof. Carlos Fiolhais aqui.

Um extracto da entrevista:
"Infelizmente, o primeiro-ministro não sabe do que está a falar, pelo que não consegue transmitir uma mensagem com sentido. Podia e devia preparar uma declaração sobre ciência em vez de falar de improviso num português rudimentar.
Factos são factos. De 1995 a 2011 as actividades relacionadas com a investigação e desenvolvimento (I&D) conheceram em Portugal um extraordinário incremento, que nos devia orgulhar. O investimento nessa área passou de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), um valor muito inferior ao da média da União Europeia a 27 países (que era de 1,8% em 1995), para 1,5%, um valor bem mais próximo da média da UE, que é de 2,1%. Embora haja que descontar uma inflação nas declarações para efeitos estatísticos devida a benefícios fiscais, o investimento das empresas também aumentou no período indicado: entre 1995 e 2011, o peso do I&D das empresas passou de 0,1% para 0,7% do PIB. O número de novos doutorados por cem mil habitantes aumentou de 5,7 para 17,5 entre 1995 e 2011. Este investimento traduziu-se num significativo aumento da produção científica, medida pelo número de publicações: passou de 24 por cem mil habitantes em 1995 para 162 por cem mil habitantes em 2011. Os investigadores portugueses não só aumentaram, como passaram a produzir mais. A qualidade, que pode ser medida pelo número de citações dos artigos, aumentou também. Quanto aos registos de patentes também subiram de 4 para 11 por milhão de habitantes de 2000 para 2010, embora sejam reduzidos em comparação com a média europeia (112 por milhão de habitantes). Passos Coelho fala em patentes, mas esquece-se que há indicadores melhores para saber o impacto da ciência na economia: número de novas "startups", investimento em capital de risco e exportações de produtos e serviços com ciência incorporada. Apesar de faltarem estatísticas fiáveis, tudo indica que estes indicadores têm crescido."