Quando estudei em França, participei numa lista às eleições municipais de Estrasburgo, a "100% à Gauche". Na altura já estava em vigor a paridade a 50%. A medida obrigou os políticos do costume a convidar mulheres de associações, de movimentos, de sectores da população que raramente se viam representados na política. A composição final da lista era muito heterogénea, partilharam-se experiências diversas e muito interessantes, debateram-se temas pouco habituais em política, o tom do debate foi mais racional e menos exaltado e praticamente não se falou de futebol.
As minhas experiências políticas sem quotas (ou de quotas baixas) em Portugal confirmam as vantagens que atribuo à paridade. Verifica-se que são os homens que continuam a controlar os partidos, estes convidam geralmente outros homens, geralmente amigos ou colegas de trabalho, fala-se de futebol e de gajas dentro e fora das reuniões, a potência dos decibéis, a agressividade da linguagem e a gesticulação ameaçadora continuam a ser critérios para designar um "bom político" e toda a panóplia de tiques machistas desde os tiques de engate até aos tiques de chefe de família continuam a ser utilizados na relação com as poucas mulheres que ainda têm paciência para suportar tudo o resto.
Não concordo nada com essa ideia peregrina de considerar uma "ofensa" as quotas para as mulheres na política. Portugal é objecto de discriminação positiva todos os dias por parte de organizações internacionais como a UE, a ESA ou o CERN, e não é por isso que nos sentimos ofendidos na nossa condição de portugueses. Sabemos perfeitamente que é uma forma mais rápida de atingir equilíbrios que são benéficos para todos, em vez de esperar duas ou três gerações para obter o mesmo resultado.
Depois de mais de 4000 anos de civilizações essencialmente guerreiras, em que a força física prevaleceu sobre a razão, em que os homens subjugaram as mulheres, ficam marcas profundas que não desaparecem de um dia para o outro. Há países que já percorreram uma boa parte do caminho, como a Suécia, mas em Portugal ainda há muita coisa a fazer. Obviamente que não defendo a paridade para sempre. Julgo que algum dia isto se há-de endireitar e nesse dia não será preciso estabelecer cotas de 1/3 ou outras para termos mulheres permanentemente bem representadas na política.
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