A vaga de incêndios verificada esta semana no norte e no centro do país vem levantar mais uma vez a questão da influência do aquecimento global na antecipação e na ampliação da época de incêndios. A frequência anormalmente elevada de fogos verificada para um mês de Março parece dar razão a uma série de trabalhos científicos publicados nas mais prestigiadas revistas da especialidade que colocam Portugal, a Península Ibérica e o Mediterrâneo entre as zonas onde aumentará a frequência de incêndios florestais. É um exercício arriscado estabelecer uma relação directa entre vagas de fogos e aquecimento global, mas o que dizem estes trabalhos muito claramente é que nas próximas décadas aumentará consideravelmente a probabilidade de deflagração de incêndios nas regiões referidas.
O artigo de Schär e Jendritzky intitulado "Climate change: Hot news from summer 2003", publicado na Nature (Vol. 432, pp. 559-560, 2004), analisa a onda de calor verificada em 2003 no sul da Europa estimando a contribuição da actividade humana para a dimensão do fenómeno. O artigo de Giannakopoulos et al. publicado pela WWF em Julho de 2005 estima o impacto que teria o aumento de 2°C da temperatura global nos países mediterrânicos e do sul da Europa. Neste trabalho podemos encontrar abundante informação sobre vários cenários climáticos que dizem respeito ao nosso país. Informação semelhante pode ser consultada no trabalho de Tom Holt e Jean Palutikof publicado pela Climatic Research Unit e no trabalho de Giorgi publicado na Geophysical Research Letters, (33, L08707, 2006). Alguma da informação contida no trabalho de Giorgi está contida neste mapa interactivo que representa as alterações climáticas esperadas em cada continente, elaborado a partir de trabalhos publicados nas revistas da especialidade.
O livro "Seis Graus" da autoria de Mark Lynas (Civilização Editora, 2007) dá uma perspectiva mais global da evolução do clima terrestre à medida que a temperatura do planeta vai aumentando a intervalos de 1°C. O capítulo I descreve os efeitos mais prováveis se a temperatura aumentar 1°C, o capítulo II descreve os efeitos esperados para um aumento de 2°C, assim sucessivamente até 6°C no capítulo VI. Lynas baseou-se apenas em trabalhos científicos, tendo sido uma boa parte destes trabalhos publicados nas mais prestigiadas revistas científicas como a Nature ou a Science. Neste sítio pode ler-se uma revisão em inglês da obra de Lynas realizada por um dos cientistas do sítio Real Climate. Portugal é citado com frequência no livro de Lynas sempre que se aborda o aumento da frequência de incêndios.
Não será certamente por falta de informação que ficarão por tomar as decisões políticas necessárias para prevenir e minimizar os efeitos catastróficos do aquecimento global no nosso país. Podemos atacar o problema dos incêndios de todas as formas convencionais (aumento de meios de combate a fogos, repressão de incendiários, limpeza de florestas, etc.), mas se ignorarmos o aquecimento global muito provavelmente veremos a área florestal do nosso país a desaparecer em cinzas nas próximas décadas.
Sem comentários:
Enviar um comentário