Não dei muita importância ao facto de os resquícios da extrema-direita em Portugal terem gasto rios de dinheiro a comprar cartões de telemóvel e a ligar de tudo o que era aparelho telefónico para eleger Salazar a grande português. Se isto é o melhor que conseguem fazer em democracia, estamos nós muito bem. Também não dei muita importância ao facto de os antigos bufos (eram mais de 100 mil), ultras, militantes da União Nacional e todos os que comiam do tacho e viviam dos privilégios do Estado Novo terem acompanhado a iniciativa. Tal como já esperava que votassem no ditador todos os que ainda acham que Angola deveria ser nossa, muitos saudosistas, muita gente inadaptada à sociedade aberta em que vivemos hoje.
O que não acho irrelevante é Maria José Nogueira Pinto (MJNP) ter votado em Salazar. MJNP teve um acesso privilegiado à educação, cresceu em berço de ouro, não tem propriamente o perfil intelectual de um bufo reformado do regime ou de um hooligan de extrema-direita. No entanto, considero que perante aquele concurso, e apesar de ser apenas um concurso, o voto de MJNP é do ponto de vista intelectual, um acto de hooliganismo histórico. Perante um leque de ilustres figuras da nossa história, de Camões ao Infante D. Henrique, MJNP preferiu uma personagem senil que contribuiu fortemente para que em 1974 fossemos o país com a maior taxa de analfabetismo, com a pior escola, a pior universidade e uma das taxas de mortalidade infantil mais elevadas da Europa. É um acto de hooliganismo histórico tão potente do ponto de vista simbólico como queimar "Os Lusíadas" ou colocar uma bomba na Torre de Belém. Para além disso é um acto revela alguma ignorância, pois Salazar sempre venerou algumas das figuras do concurso que MJNP desprezou. Um dos ex-libris do Estado Novo, o Padrão dos Descobrimento, dá todo o destaque ao Infante D. Henrique e não ao próprio Salazar. E não é por modéstia de Salazar, é porque Salazar sabia que não chegava aos calcanhares do Infante. Só um salazarista trapalhão (que é a maior parte dos que restam) é que envereda pelo contra-senso de votar em Salazar contra as figuras que o próprio sempre glorificou como exemplares para a pátria.
A dificuldade que a direita tem em sublimar a pesada herança do passado salazarista explica muitas fugas para a frente no debate político, uma das mais representativas é a deste texto de Pacheco Pereira, muito bem desmontada pelo Rui Tavares. O atraso do nosso país deve-se sobretudo ao falhanço de uma ideologia de direita e isso é incómodo mesmo para os políticos de direita mais críticos do Estado Novo, como é o caso de Pacheco Pereira. Ora, o resultado das referidas fugas para frente, mais não fazem do que transmitir uma mensagem de condescendência em relação ao salazarismo, colocam no mesmo plano, valores que não estão no mesmo plano: a tolerância e a xenofobia, o autoritarismo e a democracia, o provincianismo e o multiculturalismo, etc. Ao colocar tudo no mesmo plano, tal como se pode ler no referido artigo de Pacheco Pereira, cria-se uma falsa ideia de que todos partem da mesma base para fazer política, sem que a difícil relação com o passado salazarista se resolva definitivamente. É por isso que MJNP não tem problemas em votar em Salazar, para ela é tudo igual, ou quase igual: autoritarismo e democracia.
PS- Este simpático texto de Pacheco Pereira sobre o hooligan Mário Machado (chamar-lhe skinhead é simpático, dá-lhe o estatuto cultural que ele não tem) é mais uma acha para a mesma fogueira.
O que não acho irrelevante é Maria José Nogueira Pinto (MJNP) ter votado em Salazar. MJNP teve um acesso privilegiado à educação, cresceu em berço de ouro, não tem propriamente o perfil intelectual de um bufo reformado do regime ou de um hooligan de extrema-direita. No entanto, considero que perante aquele concurso, e apesar de ser apenas um concurso, o voto de MJNP é do ponto de vista intelectual, um acto de hooliganismo histórico. Perante um leque de ilustres figuras da nossa história, de Camões ao Infante D. Henrique, MJNP preferiu uma personagem senil que contribuiu fortemente para que em 1974 fossemos o país com a maior taxa de analfabetismo, com a pior escola, a pior universidade e uma das taxas de mortalidade infantil mais elevadas da Europa. É um acto de hooliganismo histórico tão potente do ponto de vista simbólico como queimar "Os Lusíadas" ou colocar uma bomba na Torre de Belém. Para além disso é um acto revela alguma ignorância, pois Salazar sempre venerou algumas das figuras do concurso que MJNP desprezou. Um dos ex-libris do Estado Novo, o Padrão dos Descobrimento, dá todo o destaque ao Infante D. Henrique e não ao próprio Salazar. E não é por modéstia de Salazar, é porque Salazar sabia que não chegava aos calcanhares do Infante. Só um salazarista trapalhão (que é a maior parte dos que restam) é que envereda pelo contra-senso de votar em Salazar contra as figuras que o próprio sempre glorificou como exemplares para a pátria.
A dificuldade que a direita tem em sublimar a pesada herança do passado salazarista explica muitas fugas para a frente no debate político, uma das mais representativas é a deste texto de Pacheco Pereira, muito bem desmontada pelo Rui Tavares. O atraso do nosso país deve-se sobretudo ao falhanço de uma ideologia de direita e isso é incómodo mesmo para os políticos de direita mais críticos do Estado Novo, como é o caso de Pacheco Pereira. Ora, o resultado das referidas fugas para frente, mais não fazem do que transmitir uma mensagem de condescendência em relação ao salazarismo, colocam no mesmo plano, valores que não estão no mesmo plano: a tolerância e a xenofobia, o autoritarismo e a democracia, o provincianismo e o multiculturalismo, etc. Ao colocar tudo no mesmo plano, tal como se pode ler no referido artigo de Pacheco Pereira, cria-se uma falsa ideia de que todos partem da mesma base para fazer política, sem que a difícil relação com o passado salazarista se resolva definitivamente. É por isso que MJNP não tem problemas em votar em Salazar, para ela é tudo igual, ou quase igual: autoritarismo e democracia.
PS- Este simpático texto de Pacheco Pereira sobre o hooligan Mário Machado (chamar-lhe skinhead é simpático, dá-lhe o estatuto cultural que ele não tem) é mais uma acha para a mesma fogueira.
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