Têm-se alimentado muitos fantasmas sobre as virtudes da organização japonesa, mas a realidade é que o Japão apresenta um dos piores registos de acidentes da indústria nuclear: Tokaimura (nível 4) em 1999, Mihama (nível 1) em 2004 e Fukushima (nível 5, 6 ou7?). Pior que o japonês só o programa soviético.
No caso do acidente de Tokaimura foi a lógica do lucro de uma empresa privada que se sobrepôs às regras mais elementares de segurança. Para poupar, foi guardada num único recipiente maior quantidade do que era autorizado de uma solução com material radioactivo, tendo-se atingido a massa crítica necessária para desencadear uma reacção em cadeia. A reacção emitiu fortes doses de radiação que provocou a morte de dois trabalhadores e sérios problemas de saúde a um terceiro. O acidente de Mihama em 2004 provocou a morte de quatro trabalhadores e queimaduras em sete, após a ruptura de um tubo de vapor de água a mais de 250°C. Mas este acidente ficou também marcado pela falta de transparência dos responsáveis da central sobre as consequências do acidente. A própria opção de construção de 55 reactores no arquipélago japonês, em permanente risco sísmico, insere-se na mesma lógica do lucro que se sobrepõe à segurança. Não é de estranhar a revelação da Wikileaks (divulgada no Daily Telegraph) de que um dos responsáveis da Agência Internacional de Energia Atómica teria advertido em 2008 o governo japonês para o risco que corriam as centrais japonesas em caso de um sismo muito forte. A central de Fukushima foi projectada para resistir a sismos de escala 7, o sismo da passada sexta atingiu o grau 8,9.
No Japão há uma cultura de disciplina e de respeito impressionante pelas hierarquias, aliás a II Guerra Mundial foi um período em que essa obediência hierárquica atingiu extremos impensáveis. Mas da obediência e da disciplina até à cultura da transparência e do respeito pelas regras segurança ainda vai uma grande distância. Nestes aspectos os japoneses comportam-se como outras sociedades ofuscadas pelo deus mercado.
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