domingo, fevereiro 26, 2012

Manifesto de Mira Amaral revela-se pobre e erróneo

Publicado no portal Esquerda.net

O terceiro Manifesto por uma Nova Política Energética em Portugal é pouco mais do que um manifesto contra as energias renováveis. Pouco fundamentado, o documento do grupo de pressão liderado por Mira Amaral e por Patrick Monteiro aborda com muita superficialidade as alternativas energéticas (gás de xisto, nuclear, biomassa e biocombustíveis), centrando-se no ataque às eólicas que são citadas diretamente em 16 dos 39 pontos (como eólicas ou intermitentes) e são assunto indireto de cerca de 2/3 do documento.

O mínimo que se espera de um documento sobre política energética é que argumentos técnicos sustentem a sua posição política. Ora o documento limita-se a apresentar indicadores de uma forma seletiva e descontextualizados, que dificilmente se aplicam à realidade europeia e em particular ao caso português. O exemplo mais caricato é modelo escolhido para ilustrar os baixos custos do nuclear. Entre a abundância de exemplos disponíveis, escolheu-se como termo de comparação um país que não tem centrais nucleares construídas ou em fase de construção, que tem apenas centrais em fase de projeto: os Emirados Árabes Unidos. Este grupo de pressão que apresenta tantas dúvidas sobre as eólicas, não tem dúvidas que os Emirados terão no futuro o MWh a 30 dólares, quando o preço do MWh de origem nuclear em qualquer país europeu é superior a 50 dólares. Mais significativo ainda é quando se constata que o preço total das faturas pouco reflete a vantagem do nuclear. Nos três países mais nuclearizados da UE, França, Eslováquia e Bélgica, o MWh custa aos particulares (preços de novembro de 2011): 148€, 182€ e 222€, respetivamente. Em Portugal o seu custo é de 193€, o que representa o 12° país mais caro entre os 27 países da UE. À indústria francesa, eslovaca e belga a eletricidade é fornecida a 76€, 133€ e 118€. Em Portugal o MWh custa 106€, o 20° lugar em 27. Apesar da evidência destes indicadores, podemos ler nas conclusões do manifesto (ponto 39): "o país precisa urgentemente, para ser competitivo e socialmente equilibrado, de ter energia suficiente a preços competitivos".

O documento repete a falsa ideia que as renováveis, em particular as eólicas, representam um peso elevadíssimo na fatura doméstica, quando em média o seu peso é apenas de 1,90 € por mês. Repete também que os custos das renováveis (englobam os naturais investimentos associados a uma nova energia) acumulados em 5 anos são cerca de 7 mil milhões de euros (1,4 mil milhões por ano) quando o impacto dos custos imputados às eólicas no custo da geração de eletricidade foi apenas de 4%, esquecendo os 400 milhões de euros que se poupam anualmente associados à importação de combustíveis fósseis, como gás natural e carvão, e às licenças de produção de CO2 (estudo Rolland Berger). Curiosamente todas as particularidades relativas à produção de energia eólica são apresentadas como graves, caras e de difícil resolução, mas não se hesita em propor a energia nuclear, essa sim, que comporta problemas técnicos extremamente complexos e verdadeiramente caros. Por exemplo, ainda não se revolveu o problema da conservação dos resíduos nucleares perigosos durante os cerca de 600 mil anos de atividade. Nunca se depositaram resíduos nucleares em definitivo num local adequado. Obviamente, os custos futuros desta fase ainda não foram contabilizados na fatura, sendo apenas certo que serão extremamente caros e que serão pagos pelas gerações futuras.

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