sexta-feira, agosto 19, 2005

As fotografias que não tirei

Durante o meu périplo por terras Maias, Astecas, Olmecas e Zapatecas deixei muitas fotografias por tirar, andei mais preguiçoso, mas também foram muitas horas com as mãos ocupadas a conduzir um burrito vermelho que nunca se cansou. Os índios da Serra Madre também não gostam de ser fotografados, receiam perder a alma, e respeitei a sua vontade. No entanto, na minha memória ficaram registadas aquelas tranças negras que assentavam em mantos azuis, de um azul muito escuro, com motivos dourados. Registei o tom de pele, um tom de alta montanha, lindo dentro daqueles mantos. Registei uma igreja em San Juan de Chamula com palha espalhada pelo chão em vez de bancos, recheada de velas e muitos santos, onde as tranças oravam e tocavam a palha.
Ao longo da estrada a retina substituiu a minha Minolta, "fotografei" todas as nuances de verde da floresta tropical, da savana, das montanhas, "fotografei" uma cobrazorra que se atravessou na estrada e que assassinei barbaramente (não tive hipótese de me desviar), foram meia dúzia de cratrapuns debaixo do carro e o retrovisor deu-me o instantâneo final: torcida num oito e imóvel. "Fotografei" muitos burros selvagens e os cães, muitos cães, que ladeavam os "topes" (bandas sonoras rodoviárias enormes), parecia até que faziam a guarda policial desses locais. "Fotografei" no escuro duas tartarugas gigantes a desovar nas praias do Caribe e a cria, recém saída do ovo, que se lançou que nem um tiro para o meio das ondas. "Fotografei" também muita pobreza, o pudor impediu-me de sacar a Minolta. Sobre a pobreza escreverei depois.

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