terça-feira, novembro 30, 2010

Finalmente outra economia

O Prós e Contras de ontem finalmente trouxe ao debate sobre a crise visões da economia variadas, bem longe dos habituais debates entre os amigos da banca e os amigos dos amigos da banca, em que a única diferença de opiniões é entre um que quer o FMI em Portugal ontem, o outro daqui a 10 minutos e o outro amanhã de manhã (foto via Arrastão). Pôs-se em causa, e bem, a credibilidade das agências de notação. Ouviram-se ideias interessantes. Retenho a melhor, a discriminação positiva de actividades económicas que produzam activos transaccionáveis e postos de trabalho proposta por João Ferreira do Amaral. Ouviu-se finalmente falar em detalhe sobre o verdadeiro cerne da crise: a nossa colossal dívida privada. Tendo sido bem identificado o excessivo endividamento das famílias para comprar casa. E aqui recordo que temos mais de um milhão de casas vazias, um milhão de casas construidas graças a empréstimos bancários a empresas imobiliárias e de construção. Isto representa demasiado dinheiro empatado em dívida para um país tão pequeno. Talvez se começássemos a tomar algumas medidas radicais neste sector se aliviasse a dívida mais rapidamente.

Mas também se ouviu um ex-ministro das finanças que profere sentenças sobre o país como um taxista e tal como para todos os taxistas os culpados dos desastres são sempre os outros, eles são os maiores a conduzir. Por isso quando um ex-responsável político cujo o desempenho como ministro das finanças foi catastrófico mas que acusa tudo e todos de incompetência e cuja reforma de ministro é bem compostinha, que só fala de política e de ideologia mas diz que não é político, que não quer falar dos outros países por que a crise é só nossa (é uma espécie de teoria do oásis ao contrário) mas que elogia a política laboral da República Checa (liberal à irlandesa) e a rapidez dos decisores políticos da Roménia (leia-se da máfia romena, a maior instituição do país) quando um xico-esperto destes é desancado pelo Daniel Oliveira em público e olhos-nos-olhos, todo o país que não alinha em retóricas populistas e discursos sedutores para a mediocridade televisiva patrocinada pela banca, esse país gosta e não gosta pouco, gosta muito. Obrigado Daniel!

quarta-feira, novembro 24, 2010

TV da Universidade de Coimbra

Saúda-se a abertura da UCV, a nova televisão da UC (Universidade de Coimbra). Tendo em conta que estamos na melhor universidade do país, só peca por tardia. Espero que traga dinamismo, criatividade e inconformismo, que ajude a limpar algumas velhas teias de aranha da instituição. Para já aquela panóplia de écrans por detrás dos apresentadores, uma espécie de mimetismo à portuguesa da CNN não é grande prenúncio.

sexta-feira, novembro 19, 2010

4 razões para sair da NATO

(publicado no Esquerda Republicana)
1- Por uma questão de princípio. A NATO é provavelmente a organização internacional menos democrática a que Portugal pertence. Todos sabemos que são os EUA quem manda na NATO (sublinho o verbo mandar) e os restantes países são simples figurantes, úteis para legitimar as decisões tomadas em Washington. Em geral, o quadro agrava-se durante os mandatos do Partido Republicano. Eu nem quero pensar o que terá que aceitar um membro da NATO europeu se alguma vez os EUA tiverem um presidente do Tea Party. Nesse caso fazer parte da NATO será sinónimo de dormir com o inimigo.

2- Os EUA nunca cumpriram inteiramente com as suas obrigações nas Lages e violaram frequentemente a legislação nacional, usando a base para transporte ilegal de prisioneiros e trânsito ilegal de armas nucleares. Dada a posição estratégica das Lages, o Estado Português poderia usar o espaço da base para outros fins, transformando as Lages numa base de socorro internacional com patrocínio da ONU, equipada com navios rápidos, helicópteros e aviões de socorro, busca e transporte de mantimentos. Só nos últimos anos uma base desse tipo teria sido muito útil para agir com rapidez no Haiti, em Nova Orleães (os primeiros a chegar foram guardas canadianos...), na busca do avião da Air France caído ao largo do Brasil, etc.

3- Existem ameaças maiores à nossa segurança do que as ameaças militares. O aquecimento global, a penúria energética, a penúria de água potável e o terrorismo financeiro são ameaças bem maiores à nossa soberania. Neste particular os EUA, os patrões da NATO, têm sido mais inimigos da Europa e do Mundo do que propriamente aliados. Não rima tirarmos fotografias conjuntas e sorridentes como aliados na NATO e depois o resto do ano andarmos a dar tiros nos pés uns aos outros através de guerras monetárias, terrorismo financeiro, dumping ambiental e laboral que se traduz em desemprego e baixa na qualidade de vida para os cidadãos. Isto não é sério. No concreto não somos aliados.

4- Acho fundamental que Portugal conjugue a sua estratégia militar com países que partilhem a mesma concepção de liberdade, diplomacia internacional e democracia. Acho desejável a participação num eventual exército europeu da UE e/ou outros países que rejeitem a tortura, a imposição da democracia pelas armas, o cinismo travestido de diplomacia (a realpolitik) e a utilização dos recursos naturais sem sustentabilidade. E não me digam que só os EUA é que nos podem defender. A França tem um poder nuclear e militar suficientemente dissuasor para lidar com qualquer potência do mundo (são publicações militares especializadas que o afirmam).

quinta-feira, novembro 18, 2010

Lembram-se dos testes de resistência à banca?

Extracto da entrevista de Daniel Gros do Centro de Estudos Políticos europeus à Euronews sobre a Irlanda (ou será o Tigre Celta?):

Euronews: Vimos a União Europeia lançar os testes de resistência aos bancos. Esses testes não funcionaram na realidade?
Daniel Gros: Os testes de resistência foram vendidos como testes de resistência europeus, mas na realidade trata-se de uma recolha dos testes nacionais, coordenados de forma bastante frouxa pelos organismos europeus. Ninguém das instituições europeias pôde ver os livros de contas dos bancos, os pormenores, é lá que estão as perdas e eles não puderam encontrá-las. É algo que deveria ser mudado mas há pouca vontade para o fazer.

Euronews: Alguém fez batota?
Daniel Gros: É bastante claro que algo de estranho se passou na Irlanda. O estado de saúde dos bancos irlandeses era bom em Julho e, em Setembro, de repente, o governo irlandês vê-se a braços com um défice de 32% do PIB. Isso não deveria ter ocorrido num país normal.

quarta-feira, novembro 17, 2010

Há ali mão de Mourinho

A minha teoria da constipação: Mourinho articulou aquilo com o Paulo Bento à revelia da direcção do Real Madrid. Nunca vi a Portugal a jogar tão bem tacticamente. Assim, o trabalho fica fácil, fácil para ases como Nani e Ronaldo. Foi o que faltou à Geração de Ouro.

terça-feira, novembro 16, 2010

Prémio Goncourt para Houellebecq

Michel Houellebecq é um escritor especialmente apreciado nesta casa, por isso o Prémio Goncourt de 2010 é aqui aplaudido sonoramente: Bravo! Bravo!
Em Michel Houellebecq gosto da sua escrita sobre uma temática em que os escritores portugueses são péssimos: a sexualidade. Houellebecq escreve bem sobre mulheres, amantes, taras, situações embaraçosas, no limite do aceitável, sem ser javardo nem marialvista.
Gosto também daquelas personagens principais que não se levam a sério. Gosto da sua melancolia. E acho piada ao seu positivismo atabalhoado, um positivismo à moda antiga. Gosto dos seus ensaios pelos carreiros da ficção científica, bem melhores do que a aborrecida ficção científica que se pratica nos dias que correm.

segunda-feira, novembro 15, 2010

Sobre o futuro dos resíduos nucleares

(publicado no Esquerda.net)
Os recentes protestos contra o transporte de onze vagões de resíduos nucleares entre a unidade de tratamento de La Hague, em França e Gorleben na Alemanha, contribuiriam para reabrir o debate sobre o futuro dos resíduos radioactivos produzidos por centrais nucleares. Actualmente, os resíduos nucleares mais perigosos acumulam-se em piscinas de arrefecimento e hangares ventilados. Espera-se poder vitrificar os produtos de fissão não recicláveis em blocos que serão acondicionados em contentores de aço selados a serem posteriormente armazenados em galerias escavadas em extractos subterrâneos de granito, argila ou sal situados a mais de 500 metros de profundidade. Este tipo de resíduos mantém uma actividade acima do nível da radioactividade natural durante mais de 600 mil anos.

O governo alemão tencionava construir um depósito com custos da ordem de milhares de milhões de euros para os seus resíduos mais perigosos numa mina de sal em Gorleben, onde ocorreram alguns dos recentes protestos. No entanto, a 15 de Janeiro deste ano foram evacuados 126 mil barris de resíduos nucleares de perigosidade mediana, que tinham sido colocados em 1967 numa mina de sal de Asse, depois de terem sido detectadas numerosas fugas de água contaminada. Klaus-Jürgen Roehlig, perito em gestão de resíduos da Universidade de Clausthal, declarou que este incidente “coloca em causa a escolha de minas de sal para armazenar os resíduos nucleares mais perigosos”.

Recentemente, os EUA decidiram suspender o armazenamento de resíduos nucleares no fundo da única mina que estava prevista para o efeito, na Montanha Yucca no Nevada, depois de terem sido gastos mais de 10 mil milhões de dólares no projecto. Por ordem do presidente Obama foi criada uma comissão de peritos para encontrar nova solução para os resíduos nucleares. Estão em cima da mesa soluções de depósito em furos de grande profundidade no fundo dos oceanos, no interior dos glaciares do Pólo Sul e soluções mais exóticas como a ejecção dos resíduos para o espaço.

Entre os países com programas nucleares civis, apenas a França, a Suécia e Finlândia possuem programas em marcha para guardar os resíduos em galerias subterrâneas de grande profundidade.

Custos infindáveis
Outra vertente dos protestos dos manifestantes franco-alemães que convém realçar é a questão dos custos infindáveis da energia nuclear. Desde que foram lançados os primeiros programas nucleares civis nos anos 50 – muitos destes programas resultaram de programas militares extremamente caros – nunca foram guardados definitivamente em algum lugar da Terra os resíduos nucleares mais perigosos, nocivos durante mais de 600 mil anos. Desde então, as parcelas para a factura real dos custos da energia nuclear não têm parado de aumentar e continuarão a aumentar durante mais 600 mil anos, se não se encontrar entretanto uma nova técnica para encurtar o período de perigosidade dos produtos de fissão. Até esse dia, não podemos estimar com precisão e honestidade quais os verdadeiros custos de 1 kWh produzido por uma central nuclear.

sexta-feira, novembro 12, 2010

Terrorismo financeiro nacional

"Já o tenho dito, repito: os bancos portugueses que exigem cortes de salários e de abonos de família, e que aplaudem o acordo entre o PS e PSD para o orçamento, fazem parte dos corsários que estão a comprar a dívida pública nacional com juros de mais de 7%. Ontem, compraram mais de 350 milhões em títulos. Isto é, como juro de 7%, por cada milhão que o BPI, BES, BCP ou outros investem em títulos da dívida portuguesa, exigem o pagamento de 2 milhões dentro de dez anos. Ficamos a pagar impostos para garantir esta renda. Compreende-se porque querem o aumento dos impostos. "Fizemos tudo bem", dizia Ricardo Salgado, do BES, a propósito do acordo orçamental que patrocinou. Tudo bem feito. Pagamos o dobro do que nos emprestam. A especulação não é só criada pelos fundos de capitais alemães ou chineses. A especulação mora num balcão de um banco perto de si."
Francisco Louçã, 11/11/2010.

quarta-feira, novembro 10, 2010

Descoberta nova estrutura na Via Láctea

Os cientistas que alterem os atlas do Universo e os poetas que modifiquem as estrofes, a Via Láctea mudou!
O satélite Fermi da NASA acabou de revelar uma desconhecida estrutura na nossa galáxia, até agora invisível aos antigos instrumentos de observação. De 25 mil anos-luz para "cima" a 25 anos-luz para "baixo" estendem-se duas gigantescas bolhas de raios gama e de raios-X (aqui imagem ampliada).

sexta-feira, novembro 05, 2010

Islândia e Singapura no ranking de transparência

No ranking de percepção da corrupção da Transparency International divulgado recentemente, países como Singapura, Irlanda, Barbados, Qatar e Islândia aparecem muito bem classificados, até ao vigésimo lugar.
Ando a ler "Meltdown Iceland" de Roger Boyes que descreve a sucessão de acontecimentos que levaram ao descalabro financeiro da Islândia. A Islândia em 2008 era de longe um dos países da Europa cujo sistema financeiro era menos transparente, onde clãs e máfias familiares controlavam os principais fluxos de dinheiro do país. Ao contrário de outros países a componente ideológica, o Thatcherismo doentio do ex-primeiro ministro David Oddsson, foi decisiva para se atingir a bancarrota. Dois anos depois a Islândia mudou de governo mas as elites, embora falidas, são basicamente as mesmas. Não imagino como é que um país que era tão corrupto e opaco em Outubro de 2008 possa estar de volta ao topo da transparência, acho mesmo obsceno.
Sobre Singapura só a cegueira ideológica pode explicar esta classificação. Um país não democrático controlado por uma máfia familiar é tão transparente como um Airbus 380 pintado de rosa-choque. Também só a paixão ideológica pode explicar as posições da Irlanda e do Qatar, que passam cada um pela sua versão da crise islandesa, e a dos Barbados, onde repousa e circula dinheiro de alguns dos maiores criminosos do mundo.
Enquanto os reguladores continuarem fascinados com os regulados não vamos a lado nenhum.

quarta-feira, novembro 03, 2010

Figueira da Foz no jogo Napoleão



Em ano de comemoração dos 200 anos da terceira campanha napoleónica em Portugal (a Batalha do Buçaco, entre outras), foi lançada uma extensão dedicada às campanhas peninsulares para o jogo de computador Napoleon Total War. Sou um apreciador de jogos de estratégia e devo dizer que fiquei surpreendido com o rigor histórico deste jogo (ler revisão). Mais rigoroso do que a história de Portugal da carochinha que me foi vendida na escola há 30 anos atrás pelos resquícios do programa escolar salazarista.

No jogo estão representados os principais pontos estratégicos das campanhas napoleónicas, entre os quais as Linhas de Torres, o porto da Figueira da Foz (onde desembarcaram as tropas do Duque de Wellington). Poderão ser comandadas as tropas inglesas, portuguesas, espanholas e francesas. As cidades e os portos podem ser capturados, melhorados e optimizados para as campanhas. Para os apreciadores de jogos de estratégia este é um jogo a não perder.

segunda-feira, novembro 01, 2010

Orçamento de base zero

O Orçamento de Base Zero, é uma excelente iniciativa do BE para combater o desperdício onde ele existe de facto e não à base de cortes cegos que afectam os serviços do estado mais eficientes e mais úteis. No meio da cacofonia sobre os desperdícios do estado, Louçã foi objectivo e cirúrgico na proposta. Mas não chega, enquanto vivermos numa sociedade baseada na dívida generalizada (casa, carro, consumo, etc.) e na falta de transparência do sector financeiro, estaremos perigosamente dependentes das agência de notação e dos bancos, onde se continua a praticar os crimes que mais afectam hoje as vidas das pessoas (emprego, salários, protecção social, etc).