quinta-feira, maio 19, 2005

O Não, a Europa de Nações e a extrema-direita

"...para quem deseja uma Europa unida mas uma Europa de nações e não uma híbrida construção transnacional, pouco democrática, subordinada a um directório franco-alemão e a uma burocracia internacional que funciona, como todas as burocracias, para aumentar o seu poder." JPP, Abrupto, 18 de Maio de 2005.

Li todos os artigos de Pacheco Pereira sobre a Europa e sempre tive alguma dificuldade em perceber quais eram as suas ideias sobre o futuro da Europa, ideias que saíssem do seu discurso habitual em que resume a Europa a um cão de companhia dos EUA. Na transcrição acima consegui retirar uma ideia: "uma Europa unida, mas uma Europa de Nações". Ora, uma grande fatia dos subscritores do "Não" na Europa são nacionalistas e partidos de extrema-direita, curiosamente estas tendências políticas apelam ao mesmo tipo de modelo europeu: uma Europa unida sobre a matriz de uma Europa de nações. No cartaz ao lado do partido de extrema-direita da Independência Britânica (UKIP), favorável ao "Não", percebemos bem o que significa a Europa das nações para este tipo de movimentos. O UKIP di-lo abertamente, tal como a Frente Nacional de Le Pen, mas os restantes partidos nacionalistas europeus (no qual se enquadra o PP de Paulo Portas agora à nora com opções passadas) não o dizem mas pensam-no.
Atenção, não quero insinuar que Pacheco Pereira anda próximo da extrema-direita só porque esta também defende um "Não diferente do PCP e do BE", saliento apenas que é confrangedor perceber que o projecto Europeu defendido pela extrema-direita também apele à Europa de Nações.
A UE é a instituição internacional mais democrática em que Portugal participa, mas segundo JPP esta é "pouco democrática" e subordinada ao eixo Franco-Alemão (vá lá, desta vez não entra Moscovo no eixo). E a NATO é democrática? E não estão todos os países da NATO subordinados aos EUA? Todos conhecemos a JPP a defesa acérrima de quase todas as decisões unilaterais dos EUA dentro e fora da NATO. Estamos conversados.
JPP queixa-se da burocracia internacional, isto pode ter duas leituras. Se burocracia significa burocracia, as queixas de JPP não fazem muito sentido pois qualquer leitor de fim-de-semana do Tratado Constitucional percebe que a principal vantagem do Tratado é a simplificação do emaranhado de tratados que regem a Europa (o do Carvão e do Aço só expirou em 2002). Se burocracia internacional significa direito internacional (estou mais inclinado para esta hipótese) isso significa uma regressão na Europa, um regresso à tal Europa das nações e dos nacionalismos que puseram a ferro e fogo a Europa no início do sec. XX e significa uma Europa a caminhar no sentido dos mandamentos deste belo cartaz do UKIP e dos discursos do Paulo Portas. Dessa Europa não beberei!

PS- Não deixa de ser irónico que o Partido Democrata Liberal, herdeiro do liberalismo britânico, corrente muitas vezes objecto de elogios por parte de JPP, seja pelo "Sim". Fico com a sensação que JPP imagina que no Reino Unido existe um partido semi-liberal, como o Partido Republicano americano; um liberalismo total do ponto de vista económico (neo-liberalismo no jargão político) mas um conservadorismo do ponto de vista social, ou seja, o verdadeiro neo-conservadorismo.

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